A Técnica Psicológica das Palestras Radiofônicas de Martin Luther, p.9

9. "O bom e velho tempo"

Entre as formas particulares do ardil do interesse humano, existe a que pode ser chamada de expediente do "velho e bom tempo passado". Ele consiste em dar uma ênfase especial ao que existe de obsoleto e fora de moda em nossas ações e ambiente. Provavelmente o culto americano da novidade produz uma espécie de ressentimento em todo aquele que não desfruta dos últimos benefícios da civilização tecnológica, ao passo que mesmo aqueles que vivem com a técnica moderna parecem se tornar cada vez mais frios com o avanço do progresso. Thomas propõe uma supercompensação a esse sentimento, enfatizando o caráter tradicional e genuíno do velho e familiar, vendo-os como algo que possui uma espécie de pátina que falta às novidades. Porém, assim, acontece que a própria pátina acaba vítima do padrão publicitário que promove as novidades, passando a fazer parte de um conhecido esquema da propaganda comercial. Na descrição da igreja de Thomas, por exemplo, glamouriza-se sua falta de glamour:

"De igreja temos muito pouco aqui. Nós não temos nenhuma janela de vidro colorido. Não temos grande quantidade de mármore e tijolos. Temos apenas uma velha e pequena igreja. A coisa toda não custa mais do que $ 3600. Mas, gente, mesmo fora daqui nos amamos Cristo. E estamos tentando servi-lo com o melhor de nossa capacidade. Se você está cansado da vida e pensa que Deus não existe mais, por que não vir até aqui esta noite … Acredite que você vai trazer sua velha Bíblia. Aquela velha Bíblia que você amava e foi sendo deixada de lado com o passar dos anos … Talvez ela pertença a seu velho pai, a sua mãe ou alguém mais. Vamos, traga-a, você vai, não ? (7/7/35)

Ratificando a condição de desabrigados daqueles que não podem ter boas coisas, Thomas capitaliza o ressentimento e frustração, ao interpretá-la como um modo de vida moralmente superior. Além disso, a denúncia, por ele feita, do "mármore e das janelas de vidro colorido", que são aqui uma espécie de sucedâneos religiosos do batom e maquiagem, se encaixa muito bem em sua postura ascética, anti-sensual e anti-hedonista, que ele aliás compartilha com praticamente todos os agitadores fascistas.

Detrás do ardil do interesse humano se esconde pois o ideal dos pobres tradicionalistas e anti-liberais que, a despeito de sua pobreza, se contentam com a vida tal como é e estão prontos a se sacrificar, para manter as condições que lhes fazem sofrer, em troca dos prazeres ambíguos que advêm da possibilidade de se sentirem de algum modo superiores aos ricos tanto quanto aos descontentes.

"Hoje eu vejo diante de mim uma grande multidão de pequenas mulheres, com as mão calejadas de esfregar os chão, de manejar os canos de lavagem. Eu vejo uma enorme hoste daquelas que jamais se puseram de joelhos perante o comunismo mundial. Eu vejo uma enorme hoste de feminilidade, de mulheres que estão fazendo economia, rezando, trabalhando para que o evangelho magnífico do filho de Deus continue a se espalhar pelo Mundo." (12/6/35)

Resumindo a atitude pessoal que Thomas simula, pode-se afirmar que ele sublinha o elemento pessoal, a similaridade entre ele e a audiência e a totalidade da sua esfera do interesses como uma forma de dar compensação emocional para as vidas frias e alienadas da maioria das pessoas e, em especial, dos inumeráveis indivíduos isolados pertencentes à classe média baixa [que formam sua audiência]. A proximidade e calor que caracterizam sua abordagem, e o rádio fortalece, ajudam-no a agarrá-los. O sucedâneo de sua solidão e isolamento não é pois solidariedade mas obediência. Thomas defende as formas de euforia obsoletas e quase pré-capitalistas contra as bem desenhadas condições da atualidade, visando preparar sua transformação em algo ainda mais adequado a elas, o estado totalitário. O individualismo de fachada por ele pregado, por isso, nada mais faz do que fortalecer a tendência com a qual se procura dispor do indivíduo através de sua incorporação a uma coletividade, onde ele pode se sentir abrigado mas, também, onde ele nada mais representa.

 

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