DA MISÉRIA NO MEIO ESTUDANTIL – INTERNACIONAL SITUACIONISTA III


III.CRIAR POR FIM A SITUAÇÃO QUE IMPOSSIBILITE QUALQUER REGRESSO AO PASSADO

"Ser de vanguarda é caminhar a par da realidade" (1). A critica radical do mundo moderno precisa de ter agora por objecto e como objectivo a totalidade. Ela precisa de ter :por objecto, inseparavelmente, o seu passado real, aquilo que ele é efectivamente, e as perspectivas da sua transformação. Isto porque, para poder dizer toda a verdade do mundo actual, e a fortiori para ;formular o projecto da sua inteira subversão, é necessário poder revelar-se toda a sua história oculta, quer dizer, encarar de forma inteiramente desmistificada e fundamentalmente critica a história de todo o movimento revolucionário internacional, há mais de um século inaugurada pelo proletariado dos países do Ocidente, encarando deste modo as suas "derrotas" e as suas "vitórias". "Este movimento contra o conjunto da organização do velho mundo há muito tempo já que acabou" (2); e acabou sem êxito. A sua última manifestação histórica consistiu na derrota da revolução ,proletária em Espanha (em Barcelona, em Maio de 1937). Todavia, tanto os seus "insucessos" oficiais como as suas "vitórias" oficiais têm de ser analisados à luz dos seus prolongamentos, e restabelecidas as suas verdades respectivas. Deste modo, podemos afirmar que "há derrotas que constituem vitórias e vitórias mais vergonhosas que derrotas" ( Karl Liebknecht na véspera do seu assassínio) . Com efeito, a primeira "derrota" do poder proletário, a Comuna de Paris, constitui na realidade a sua primeira grande vitória já que, pela ,primeira vez, o proletariado primitivo pôde assim afirmar a sua capacidade histórica para dirigir livremente o conjunto da vida social. Da mesma ,forma, a sua primeira grande "vitória", a revolução bolchevista, não passa, feitas as contas, da sua mais pesada derrota. O triunfo da ordem bolchevista coincide com o movimento de contra-revolução internacional, iniciado com o esmagamento dos espartaquistas pela "social-democracia" alemã. O seu comum triunfo mostrou-se mais profundo do que a sua aparente oposição, e esta ordem bolchevista não passava, afinal, de um novo disfarce e de uma figura particular da velha ordem. Os resultados da contra-revolução russa foram, com efeito, os seguintes: internamente o estabelecimento e o desenvolvimento de um novo modo de exploração, o capitalismo burocrático de Estado; externamente, a multiplicação das secções da Internacional dita comunista, sucursais destinadas a defender aquele capitalismo e a propagar o seu modelo.

Nas suas diferentes variantes burocráticas e burguesas, o capitalismo mostrava-se de novo florescente – sobre os cadáveres, agora, dos marinheiros de Cronstadt e dos camponeses da Ucrânia, dos operários de Berlim, Kiel, Turim, Xangai e, mais tarde, de Barcelona.

A III Internacional, aparentemente criada pelos bolchevistas para lutar contra os restos da social-democracia reformista da II Internacional, e para agrupar a vanguarda proletária nos "partidos comunistas revolucionários", estava por demais ligada aos seus criadores e aos seus interesses para poder realizar, onde quer que fosse, a verdadeira revolução socialista. A II Internacional constituía, na realidade, a verdade da III. Muito cedo, o modelo russo impôs-se às organizações operárias do Ocidente, e as evoluções respectivas foram uma única e mesma coisa. À ditadura totalitária da burocracia, nova classe dirigente, sobre o proletariado russo, correspondia, no seio destas organizações, o domínio de uma camada de burocratas políticos e sindicais sobre a grande massa dos operários, cujos interesses se tornaram francamente contraditórios com os desses dirigentes. O monstro estalinista perseguia a consciência operária, ao mesmo tempo que o capitalismo, em vias de burocratização e de superdesenvolvimento, resolvia as suas crises internas e, arrogantemente, afirmava a sua nova vitória, cuja permanência reclama. Uma mesma forma social, em aparência divergente e variada, toma conta do mundo, e é assim que os princípios do velho mundo continuam a governar o nosso mundo moderno. Os mortos perseguem ainda, como um pesadelo, o cérebro dos vivos.

No seio deste mundo, múltiplas organizações pretensamente revolucionárias limitam-se a combatê-lo em aparência, no seu próprio terreno, através das maiores mistificações. Todas elas invocam ideologias mais ou menos petrificadas, limitando-se de facto a participar na consolidação da ordem dominante. Os sindicatos e os partidos políticos forjados pela classe operária com vista à sua própria emancipação passavam entretanto, de meros reguladores do sistema, a propriedade privada de dirigentes que trabalham com vista à sua emancipação particular, conseguindo um estatuto no seio da classe dirigente duma sociedade que não pensam sequer pôr em questão. O programa real destes sindicatos e partidos limita-se a retomar. insipidamente, a fraseolgia "revolucionária", e a aplicar de facto as palavras de ordem do mais amenizado reformismo, visto o próprio capitalismo se tornar oficialmente reformista. Onde puderam tomar o poder – em países mais atrasados do que a Rússia -, o resultado dessa tomada do poder limitou-se à reprodução do modelo estalinista do totalitarismo contra-revolucionário (3). E onde isso não aconteceu constituem o complemento estático e necessário (4) ao auto-regulamento do capitalismo burocratizado, a contradição indispensável à manutenção do seu humanismo policial. Por outro lado, continuam a ser, em relação às massas operárias, os garantes indefectíveis e os incondicionais defensores da contra-revolução burocrática, bem como os dóceis instrumentos da sua política externa. Num mundo fundamentalmente impostor, eles são os portadores da mais radical impostura, activando-se em favor da perenidade da ditadura universal da Economia e do Estado. Tal como o afirmam os situacionistas, "um modelo social universalmente dominante, que tende ao auto-regulamento totalitário, só aparentemente é combatido por falsas contestações situadas, em permanência, no seu próprio terreno, ilusões que, pelo contrário, reforçam este modelo. O pseudo-socialismo burocrático não passa do mais grandioso destes disfarces do velho mundo hierárquico do trabalho alienado" (5). O sindicalismo estudantil, nisto tudo, não passa, quanto a ele, da caricatura duma caricatura, a repetição burlesca e inútil de um sindicalismo degenerado.

A denúncia teórica e prática do estalinismo, em todas as suas formas, tem de constituir a banalidade de base de todas as futuras organizações revolucionárias. É evidente que em França, por exemplo, onde o atraso económico ainda faz recuar a consciência da crise, o movimento revolucionário só das ruinas do estalinismo destruído poderá renascer. A destruição do estalinismo tem de tornar-se o delenda Carthago da última revolução da pré-história.

Esta tem ela própria de romper definitivamente com a sua própria pré-história, e extrair toda a sua poesia do futuro. Os "bolchevistas ressuscitados", que representam a farsa de "militantismo" nos diferentes grupúsculos esquerdistas, são mofas emanações do passado, e de modo nenhum anunciam o futuro. Resto do grande naufrágio da "revolução traída", apresentam-se como os féis defensores da ortodoxia bolchevista: a defesa da URSS é a sua insuportável fidelidade e a sua escandalosa demissão.

Só nos famosos países subdesenvolvidos (6), onde eles próprios ratificam o subdesenvolvimento teórico, ,podem conservar ilusões. De Partisans (a) (órgão dos estalino-trotskismos reconciliados) a todas as tendências e meias tendências que entre si disputam "Trotski" no interior e no exterior da IV Internacional, reina uma mesmíssima ideologia revolucionarista e uma mesmíssima incapacidade prática e teórica para compreender os problemas do mundo moderno. Separam-nos, da Revolução, quarenta anos de história contra-revolucionária. Não têm razão por já não estarem em 1920, e em 1920 já não tinham razão. A dissolução do grupo "ultra-esquerdista" Socialisme ou Barbarie (b) , após a sua divisão em duas fracções, a "modernista cardanista" (c) e a "marxista antiquada" ( de Pouvoir Ouvrier) (d) , prova, se tal fosse necessário, que não pode haver revolução fora do moderno, nem pensamento moderno fora da crítica revolucionária a reinventar (7). Tal dissolução é significativa na medida em que qualquer separação entre estes dois aspectos cai inevitavelmente, quer no museu da pré-história revolucionária terminada, quer na modernidade do poder, isto é, na contra-revolução dominante: Voix ouvriere ou Arguments.

Quanto aos diversos grupúsculos "anarquistas", todos eles prisioneiros desta denominação, nada mais possuem para além desta ideologia reduzida a um mero rótulo: o incrível Monde Libertaire (e) , evidentemente redigido por estudantes, atinge o mais fantástico grau da confusão e da parvoíce. Essa gente tolera efectivamente tudo, visto tolerarem-se uns aos outros.

A sociedade dominante, que se gaba da sua permanente modernização, tem agora de encontrar a quem falar, isto é, à negação modernizada que ela própria produz (8): "Deixemos agora aos mortos o cuidado de enterrar os seus mortos e de os chorar". As desmistificações práticas do movimento histórico desembaraçam a consciência revolucionária dos fantasmas que a perseguiam; a revolução da vida quotidiana encontra-se perante as tarefas imensas que tem de realizar. A revolução, tal como a vida que anuncia, precisa de ser reinventada. Se o projecto revolucionário continua fundamentalmente o mesmo (a abolição da sociedade de classes), isso acontece porque em nenhures as condições em que se forma foram radicalmente transformadas. Trata-se de o retomar, tal projecto, com um radicalismo e uma coerência ampliados pela experimentada falência dos seus antigos portadores, a fim de evitar que a sua realização fragmentária conduza a uma nova divisão da sociedade.

A luta entre o poder e o novo proletariado só se pode manifestar com base na totalidade; é por isso que o futuro movimento revolucionário precisa de abolir, no seu seio, tudo quanto tenda a reproduzir os produtos alienados do sistema mercantil (9). Ele precisa de ser, simultaneamente, a sua crítica viva e a negação que em si mesma contém todos os elementos da superação possível. Tal como bem o entendeu Lukács (para o aplicar, porém, a um objecto que disso não era digno, o partido bolchevista), a organização revolucionária é uma mediação necessária entre a teoria e a prática, entre o homem e a história, entre a massa dos trabalhadores e o proletariado constituído em classe. As tendências e divergências "teóricas" ,precisam de se transformar imediatamente numa questão de organização se pretendem mostrar a via da sua realização. A questão da organização constituirá a sentença final do novo movimento revolucionário, o tribunal perante o qual será julgada a coerência do seu .projecto essencial: a realização internacional do poder absoluto dos Conselhos Operários, tal como .foi esboçado pela experiência das revoluções proletárias deste século. Uma tal organização tem de salientar a critica radical de tudo aquilo que alicerceia a sociedade que combate, a saber: a produção mercantil, a ideologia sob todos os seus disfarces, o Estado e as separações por ele impostas.

A cisão entre teoria e .prática constitui o escolho em .que tropeçou o velho movimento revolucionário. Só os momentos mais altos das lutas proletárias superaram esta cisão e depararam com a sua verdade. Nenhuma organização conseguiu ainda saltar por sobre este Rodes. A ideologia, por mais "revolucionária" que se apresente, está sempre ao serviço dos chefes, e é o sinal de alarme que designa o inimigo dissimulado. É a razão por que a critica da ideologia tem de constituir, em última análise, o problema central da organização revolucionária. Só o mundo alienado produz a impostura; e a impostura não poderia reaparecer no interior do que pretende conter a verdade social sem que esta organização deixasse de se transformar, ela própria, numa nova impostura, num mundo fundamentalmente impostor.

A organização revolucionária que ,projecta realizar o poder absoluto dos Conselhos Operários deve constituir o terreno onde se esboçam todos os aspectos positivos deste poder. Por isso precisa de levar a cabo uma luta mortal contra a teoria leninista da organização. A revolução de 1905 e a organização espontânea dos trabalhadores russos em sovietes era já uma crítica em actos (10) desta teoria nefasta. Mas o movimento bolchevista teimava em acreditar que a espontaneidade operária não poderia ultrapassar a consciência "trade-unionista" e que seria, por isso, incapaz de apreender "a totalidade". Eis, porém, o que isto significava: degolar o proletariado a fim de ,permitir que o partido "encabeçasse" a Revolução. Não se pode contestar, tão impiedosamente como o fez Lenine, a capacidade histórica do proletariado para se libertar ,por si próprio, sem contestar a sua capacidade para gerir inteiramente a sociedade futura. Numa tal perspectiva, a palavra de ordem "todo o poder aos sovietes" não significava senão a conquista dos sovietes pelo partido, a instauração do Estado do partido em vez do "Estado" em deperecimento do proletariado em armas.

É todavia esta palavra de ordem que se mostra necessário retomar radicalmente, desembarançando-a da má fé dos bolchevistas. O proletariado só pode entregar-se ao jogo da revolução se o fizer para conquistar um mundo por inteiro; de contrário não é coisíssima nenhuma. A forma única do seu poder, a autogestão generalizada, não pode ser partilhada com qualquer outra força. Ao mesmo tempo, e na medida em que ele é a dissolução efectiva de todos os poderes, não poderá tolerar qualquer limitação (geográfica ou de outra ordem); os compromissos que aceitar transformam-se de imediato em comprometimentos, em demissão. "A autogestão deve constituir simultaneamente o meio e o fim da luta actual. Ela é, não só aquilo que, na luta, está em jogo, mas igualmente a forma adequada desta luta. É para si mesma a matéria que activa e a sua própria pressuposição" (11).

A critica unitária do mundo é a garantia da coerência e da verdade da organização revolucionária. Tolerar a existência dos sistemas de opressão (na medida em que envergam uma fatiota "revolucionária", por exemplo) num ponto qualquer do mundo consiste em reconhecer a legitimidade da opressão. Do mesmo modo, se uma tal crítica tolera a alienação num qualquer domínio da vida social, é porque aceita a fatalidade de todas as reificações. Não basta ser-se partidário do poder abstracto dos Conselhos operários; é necessário mostrar o seu significado concreto: a supressão da produção mercantil e, por conseguinte, a supressão do proletariado. A lógica da mercadoria é a racionalidade inicial e última das sociedades actuais; é ela a base do auto-regulamento totalitário destas sociedades, comparáveis a puzzles cujas peças, tão pouco semelhantes em aparência, na realidade são equivalentes. A reificação mercantil constitui o obstáculo essencial duma emancipação total, da livre edificação da vida. No mundo da produção mercantil, a praxis não se realiza em função de um objectivo determinado e de modo autónomo, mas sim por força de directivas :provindas de forças exteriores (f) .E se as leis económicas dão a impressão de se transformar em leis naturais duma espécie peculiar, isso acontece na medida em que a sua força se baseia unicamente na "ausência de consciência daqueles que nisso participam".

O principio da produção mercantil é este: o extravio do indivíduo na criação caótica e inconsciente de um mundo que escapa inteiramente aos seus criadores. O núcleo radicalmente revolucionário da autogestão generalizada é, pelo contrário, a direcção consciente, por todos, do conjunto da vida. A auto-gestão da alienação mercantil limitar-se-ia a fazer de todos os homens os programadores da sua própria sobrevivência: é a quadratura do circulo. A tarefa dos Conselhos Operários não consistirá portanto na auto-gestão do mundo existente, mas na sua transformação qualitativa ininterrupta – isto é, na superação concreta da mercadoria (da mercadoria enquanto gigantesco desvio da produção do homem por ele próprio).

Esta superação implica naturalmente a supressão do trabalho e a sua substituição ,por um novo tipo de actividade livre; o que significa a abolição de uma das separações fundamentais da sociedade moderna: a separação entre um trabalho cada vez mais reificado e ócios passivamente consumidos. Certos grupúsculos, hoje em liquefacção, como S. ou B. ou P.O.(12), e apesar disso congraçados com base na moderna palavra de ordem do poder operário, continuam a seguir, no tocante a esta questão central, o velho movimento operário, na via do reformismo do trabalho e da sua "humanização". É o próprio trabalho que agora se torna necessário atacar. Longe de ser uma "utopia", a sua supressão é condição primeira para a superação efectiva da sociedade mercantil, para a abolição na vida quotidiana de cada indivíduo da separação entre o "tempo livre" e o "tempo de trabalho", sectores complementares duma vida alienada onde indefinidamente se projecta a contradição interna da mercadoria entre valor de uso e valor de troca. Só fora desta oposição poderão os homens fazer da sua actividade vital um objecto da sua vontade e da sua consciência, e contemplarem-se eles próprios num mundo que eles próprios terão criado. A democracia dos Conselhos Operários é o enigma solucionado de todas as separações actuais; é ela que torna "impossível tudo o que existe fora dos indivíduos".

O domínio consciente da história pelos homens que a fazem: é esta a totalidade do projecto revolucionário. A história moderna, tal com toda a história passada, é o produto da praxis social, o resultado – inconscientemente – de todas as actividades humanas. Na época do seu domínio totalitário, o capitalismo produziu aquilo que é a sua nova religião: o espectáculo. O espectáculo é a realização terrena da ideologia. Nunca, anteriormente, o mundo tão bem andara de pés para o ar. "E tal como a crítica da religião, a crítica do espectáculo constitui, hoje em dia, a condição primeira para a existência de qualquer critico" (13).

Isto porque, historicamente, o problema da revolução se põe à .humanidade. A acumulação, cada vez mais grandiosa, dos meios materiais e técnicos, só pode comparar-se à insatisfação cada vez mais profunda de todos. A burguesia e a sua herdeira a Leste, a burocracia. não podem dispor do modo de utilização deste superdesenvolvimento que constituirá a base da poesia do futuro, e isto justamente na medida em que ambas trabalham em prol da manutenção duma ordem antiga. Quanto muito, uma e outra dispõem apenas do segredo do seu uso policial. Ambas se limitam a acumular o capital e, por isso, o proletariado; e o proletário é todo o indivíduo sem qualquer poder sobre o emprego a dar à sua vida, e que o sabe. A oportunidade histórica do novo proletariado reside em ser o único herdeiro consequente da riqueza sem valor do mundo burguês; riqueza que se trata de transformar e de superar, no sentido do homem total buscando a apropriação total da natureza e da sua própria natureza. Esta realização da natureza do homem só pode ter sentido através da satisfação sem limites e da multiplicação infinita dos desejos reais que o espectáculo recalca e expulsa para as zonas longínquas do inconsciente revolucionário, e que só fantasticamente é capaz de realizar, no delírio onírico da sua publicidade. Porque a realização efectiva dos desejos reais, quer dizer, a abolição de todas as pseudonecessidades e de todos os pseudodesejos, diariamente criados pelo sistema para perpetuar o seu poder, não pode conseguir-se sem a supressão do espectáculo mercantil e sem a sua superação positiva.

A história moderna só pode ser libertada e as suas inumeráveis aquisições livremente utilizadas pelas forças que recalca e expulsa: os trabalhadores sem qualquer poder sobre as condições, o sentido e o produto das suas actividades. No século XIX, o proletariado era já o herdeiro da filosofia; ele tornou-se agora o herdeiro da arte moderna e da primeira critica consciente da vida quotidiana. Não poderá suprimir-se sem realizar, ao mesmo tempo, a arte e a filosofia. Transformar o mundo e alterar a vida são para ele uma única e a mesma coisa, as inseparáveis palavras de ordem que acompanharão a sua supressão enquanto classe, a dissolução da sociedade presente enquanto reino da necessidade, e o acesso por fim possível ao reino da liberdade. A crítica radical e a reconstrução livre de todos os procedimentos e valores impostos pela realidade alienada são o seu programa máximo, e a criatividade liberta na construção de todos os momentos e acontecimentos da vida constitui a única poesia que poderá reconhecer, a poesia feita por todos, o iniciar da festa revolucionária. As revoluções proletárias serão festas ou não serão coisíssima nenhuma, porque a vida que anunciam será ela também criada sob o signo da festa. O jogo é a racionalidade última desta festa; viver sem tempos mortos e gozar sem impedimentos são as únicas regras que poderá reconhecer.

1. International Situationiste, nº 8.
2. Idem, nº 7.
3 A realizaçao eferctiva deste modelo consiste na tendência a industrializar o país, através da clássica acumulação primitiva à custa do campesinato, acumulação esta acelerada pelo terror burocrático.
4. Desde há 45 anos que em França o partido dito comunista não dá um passo no sentido da tomada do poder, e o mesmo acontece em todos os países avançados onde o exército dito vermelho não chegou.
5. "Les Luttes de classes en Algérie", Internationale Situationniste, n. 10.
6. A respeito do papel que desempenharam na Argélia vide "Les luttes de classes em Algérie", Internationale Situationiste, n. 10.
7. Internationale Situationniste, nº. 9.
8. "Adresse aux révolutionnaires…", Internationale Situationniste, nº. 10.
9. Definido este pela predominância do trabalho-mercadorla.
10. Depois da crítica teórica levada a cabo por Rosa Luxemburg.
11. Les luttes de classes en Algérie-, Ibidem.
12. Socialisme ou Barbarie, Pouvoir Ouvrier, etc. Pelo contrário, um grupo como I. C. O.*, ao opor-se à constituição duma qualquer organização e duma teoria coerente, fica assim condenado à inexistência.
* I. C. O.: Informations et Correspondences Ouvrières, boletim mensal publicado de Outubro de 1958 a Junho de 1973, por um grupo anti-sindical partidário dos conselhos operários. Resultante duma cisão de Socialisme ou Barbarie, este grupo pretendia lutar contra o dirigismo, limitando-se a digundir informações sobre as lutas operárias e a favorecer os contactos entre operários radicais. Pode consultar-se a seu respeito a revista Internationale Situationniste, nºs 11 e 12. Do grupo I. C. O. existe publicado em português o livro Luta de classes na Polónia (Centelha, Coimbra, 1976), tímida tradução de Capitalisme e lutte de classes en Pologne, 1970-71 (Spartacus, Paris, 1975), obra de que foi amputada pela Centelha toda a parte teórica, fundamental para a compreensão dos acontecimentos sociais na Polónia e, por extensão, nos países de capitalismo de Estado.
13. Internationale Sltuatlonniste. nº. 9.
(a) Partisans: revista terceiro-mundista (1961-1972) editada pelo trotskista François Maspéro. (N. do T.).
(b) Sociallsme ou Barbarie: revista fundada em 1949 e que se mantém até 1966. Leva inicialmente a cabo uma útil actividade de clarificação teórica, baseada numa crítica clara do estalinismo. Entre os seus principais animadores contam-se Cornelius Castoriadis e Henry Simon, de quem há textos editados em Português (N. do T.)
(c) "Cardanista": de Paul Cardan, um dos pseudónimos de Castoriadis (N. do T.) .
(d) Pouvolr Ouvrier: orgão da tendência mais leninista que teve origem em Sociallsme ou Barbarle. (N. do T.).
(e) Le Monde Libertaire: órgão oficial da Federação Anarquista (francesa). (N. do T.).
(f) Isto é, de forças exteriores ao indivíduo. (N. do T.).

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