FORA PM DO MUNDO: RELATO SOBRE A PM NA USP

O Ato de ontem, 9 de
junho, corria normalmente, exceto alguns policiais que volta e meia
provocavam entre a multidão. Por exemplo, num determinado momento um
diretor do sindicato orientava uma motorista que ficou assustada no
carro (fazendo assim o trabalho que deveria ser da CET) quando foi
empurrado por um policial que estava passeando entre a multidão.

Após as pessoas no ato
ficarem gritando “Fora PM !” na frente da fileira da polícia em
formação de choque, pouco depois do portão principal, atirarem
flores, gritarem coxinha e “FORA PM DO MUNDO ” parecia que nada
ia acontecer. Não havia nenhuma tensão entre as pessoas que
voltavam do ato e davam-no por encerrado.

Todos estavam
tranquilos, inclusive a polícia, achando que tudo havia acabado,
quando repentinamente o efetivo de policiais da força tática
paramentados com material de choque aumentou na frente do portão
principal e cinco policiais que, acredita-se, não estavam a observar
passarinhos, apareceram no meio da multidão e provocaram as pessoas
que passavam. Alguém gravou tudo e postará em breve no You Tube.

Um grupo começou a
gritar “Fora PM!, fora PM!” para tentar fazê-los se retirar e os
policiais foram gerando cada vez mais atrito, até que a situação
ficou tensa.

Neste instante
começaram a chover bombas de efeito moral, balas de borracha e gás
lacrimogêneo a tal intensidade que pareciam fogos de artifício. Um
estudante, diretor do DCE [Diretório Central dos Estudantes, a
Associação de Estudantes] que estava na parte da frente do ato,
correu para trás e foi alvejado com uma bala de borracha que se
alojou na perna. Um amigo aplicou-lhe um torniquete pois sangrava
muito e retirou-o do local levando-o ao Hospital Universitário,
infelizmente (pois lá eles ficham alunos atendidos nestas situações
e encaminham para a polícia).

Outros estudantes,
quando caíam no chão, tomaram muitos golpes de tonfa (o cacetete
duro com uma barra lateral) de vários policiais ao mesmo tempo, como
um estudante da Escola de Comunicação e Artes. Soube de 6
estudantes que apanharam muito, e bombas de efeito moral que caíram
sobre seus corpos arrancando nacos de carne quando os atingiram de
raspão.

Neste momento o carro
de som que estava na frente da reitoria foi tentar voltar para chamar
os companheiros e orientá-los quando a polícia prendeu o
sindicalista demitido Claudionor Brandão de cima do carro de som,
junto com um estudante do DCE.

Neste momento fiquei
conduzindo pessoas desorientadas e em crise de choro para o CRUSP
[residência estudantil], antes que a fileira da choque chegasse,
pois a polícia avançava atirando bombas e mais bombas sem permitir
a dispersão. Após vários minutos alguns tentaram resistir,
principalmente para proteger os ônibus de outras cidades que estavam
lá com funcionários e estudantes para o ato do fórum das seis
horas, vindos de várias universidades estaduais paulistas, e pessoas
confusas que não sabiam para onde ir. Há pessoas que não soube do
destino, o que me preocupa.

Observei pela televisão
dos porteiros dos blocos, ao entrar no CRUSP que os prédios do
CRUSP, assim como da FFLCH [Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências
Humanas], estavam cercados e soube que os estudantes subiram até lá
onde estava acontecendo uma reunião da ADUSP [sindicato dos
professores da USP]. Notei que o helicóptero dava coordenadas
precisas para perseguirem todas os aglomerados onde quer que as
pessoas fugissem.

Fui até o sindicato
para saber quem havia sido preso e se algo de pior aconteceu por lá,
pois vi pessoas apanhando na praça do relógio, no centro da
Universidade, e imaginei que os policiais seguissem ao sindicato.

 

Contornamos o prédio
da FFLCH, onde notamos que a polícia havia recuado, mantendo apenas
uma fileira em um lado. Não sei se as pessoas viram que o prédio
estava todo cercado antes e que a fileira da Tropa de Choque estava
no P1, caso houvesse resistência ativa contra a Força Tática.
Descobrimos lá que bombas de gás lacrimogêneo e efeito moral
interromperam a reunião da ADUSP e que uma caiu ao lado da diretora
da FFLCH, Sandra Nitrini, que estava junto a outras professoras que
iam negociar com a polícia.

Outra bomba de efeito
moral caiu ao lado da professora Adma. Parecia que o prédio ia ser
invadido, mas conseguiram negociar.

Felizmente nada de pior
aconteceu, mas gostaria que os professores também se pronunciassem,
pois a media [comunicação social] mentirá e dirá absurdos.

Houve posteriomente um
ato que se transformou numa assembléia na avenida em frente ao
prédio de FFLCH para encaminhar atividades para hoje, 10 de junho,
como o ato ao meio dia.

Descobri que os
companheiros mais próximos estavam bem, fora balas de borracha e
fragmentos de bombas de efeito moral de raspão. Todos estavam muito
bravos [zangados, excitados] e quando a polícia mandou avisar
indiretamente que deveriam sair da avenida, não saíram.

Muitos alunos desceram
de várias unidades, mas todos estão sendo observados. Há câmeras
por todas parte, a universidade mantém um serviço de inteligência
[vigilância e informação] contra ativistas havia policiais
infiltrados.

Soube de uma aluna que,
pouco antes de chegar, abordou um sujeito perguntando: – O que acha
que está acontecendo ? Ele respondeu: – eu não sei! Ela perguntou:
– Você é de qual unidade ? Ele disse: – Educação Física. Ela
respondeu: – Eu também, qual curso? Ele disse: – Tenho que ir, tenho
que ir … Explicaram pra ela o que é um P2, o policial infiltrado,
e que estávamos sendo vigiados por toda a parte.

Hoje continuará a
tensão, e espero que os professores tenham coragem, pois ontem, toda
a USP foi atacada, estudantes, funcionários e professores.

Apesar de que, deve-se
lembrar, a medida que aprovou que toda a ocorrência de ativistas na
USP demande que se chame a polícia foi aprovada no Conselho
Universitário (na USP chamado C.O., para evitar que a sigla seja CU)
no ano passado, sob pressão do candidato a reitor, diretor do
Direito e de extrema-direita, João Grandino Rodas.

Além disso, deve-se
lembrar que a medida que deu jurisprudência para a polícia contra
os piquetes foi a lei antigreves do interdito proibitório, que faz
com que se utilize um mandato de reintegração de posse de um prédio
que não se tem posse para evitar o piquete. Assim como na Embraer
proíbe-se panfletar a menos de 5 km de raio da fábrica.

Sentimos agora, mas
está em plena vigência desde o ano passado o AI-5 (Ato
institucional número cinco, lei do regime militar que proibia todas
as atividades políticas) contra o ativismo na USP e em todos os
sindicatos que se neguem a apenas regular o valor da mercadoria
trabalho em acordos espúrios com os patrões, controlando os
trabalhadores para que aceitem demissões neste período de crise.

Deve-se lembrar também
que a Polícia Militar é uma força paramilitar brasileira, que é
parecida com muitas outras que permaneceram em operação em países
que passaram por ditaduras mal resolvidas. É um tipo de força
militar que é utilizada contra a população pobre, com maior
violência quanto menor o valor da vida em questão, como se vê em
Paraisópolis e nas ruas de São Paulo, e que é diferente da polícia
que investiga crimes e registra ocorrências cotidianas.

É preciso que as
pessoas não tratem o assunto como Fora PM com suas botas espúrias
de nosso campus sagrado, mas que coloquem com todas as letras e que
se politize o debate: Fora PM do mundo!

Publicado originalmente em: Passa Palavra 

http://passapalavra.info/?p=5629

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